Alemanha, 1930. Um jovem judeu fica fascinado por um “inimigo” que aos poucos ascende ao poder: B., líder populista cuja propaganda política cria uma atmosfera cada vez mais ameaçadora, opressiva e profundamente antissemita. Diante da barbárie, o protagonista decide assumir uma neutralidade moral, defendendo que, até num duelo de vida ou morte, é preciso levar em conta as razões do inimigo. Assim, distancia-se cada vez mais de seu povo, enquanto se vê progressivamente absorvido pela figura carismática de um ditador.
Publicado em 1959, A morte do inimigo passou cinco décadas relegado ao esquecimento, até ser reconhecido como obra-prima, com reedições na Europa e inúmeras traduções ao redor do mundo. Esta não foi a primeira vez em que o romance desapareceu e tornou a aparecer. Suas cinquenta primeiras páginas ficaram, de fato, enterradas durante a Segunda Guerra Mundial, enquanto Hans Keilson combatia a ocupação nazista na Holanda. Quando o conflito chegou ao fim, o autor pôde enfim concluir sua obra.
Sem nomear a realidade, lançando mão de um recurso original e desafiador - palavras como “Hitler”, “judeu”, “nazista” e “Alemanha” não aparecem uma só vez ao longo do livro -, o autor de Comédia em tom menor demonstra total domínio da construção narrativa, fazendo valer sua alcunha de gênio, concedida em 2010 pelo New York Times. Embora o contexto de A morte do inimigo logo fique claro ao leitor, Keilson cria uma parábola universal, capaz de abarcar qualquer regime totalitário. Mais do que isso, ao revelar os limites da razão diante do Mal, o autor evidencia sua compreensão sensível e aguçada da natureza humana.