Neobarroco? Antes que um conceito assente, que defina um movimento ou uma vertente específicos, histórica e “biograficamente” delimitados, o neobarroco é um modo de uma tendência: um estar antes do que um ser.
Caracteriza-se, via de regra, pela abertura modal, muitas vezes intertextual, para com procedimentos éticos e estéticos do seu maior, o Barroco, instância privilegiada como definidora ou grande interpretante das culturas ibéricas ou mesmo católico-mediterrâneas. Camada que imanta o texto poético de uma reverberação multiforme e no entanto identificável e particular, o barroco — e portanto o neobarroco — seria uma pulsão, que instaura uma tensão que se completa, idealmente, numa leitura capaz de empatia. Nesse sentido, não haveria texto barroco — e, talvez, mais ainda neobarroco, considerando a multiplicidade das escolhas (formais, ideológicas, discursivas…) da contemporaneidade — sem um leitor a ele proclive.
Justamente aqui se toca na questão do gosto, e ainda: na do quociente de sedução do artefato poético junto ao público leitor. Sem que os procedimentos barroquizantes tivessem desaparecido do horizonte da cultura latino-americana durante o século passado, e que possam ser aqui e acolá perceptíveis na produção de boa parte dos grandes nomes da poesia produzida no continente durante o período, houve e há um crescendo a ele conexo durante as últimas décadas. A presente antologia organizada por Claudio Daniel tem o mérito de buscar mapeá-lo entre vários países, origens geracionais e estéticas, e nas duas línguas da América Latina, sem contudo, et pour cause, oferecer um perfil fechado e totalizador: antes, um levantamento em transição e, porque não dizê-lo, também em risco. Não a cartografia exata, nem a ideal para que comprazesse os desatinos de alguma diretriz crítica que só se satisfaz com a ontologia (e a antologia…) acabada, e com o perfil “marmóreo”, mas um tremeluzente entre-estar figuracional, um mapa in progress, um tanto borroso e, também — e por que não? — barroso.
Barro contra mármore, e aparição contra verbete: um algo de modernidade (ou pós-modernidade?), não-programática mas sim, e paradoxalmente, real, no aqui/agora. Que oxalá seja perceptível para o leitor, e que oxalá, enfim, fulgure.
Horácio Costa